Pesquisa Básica | https://doi.org/10.21041/ra.v11i2.480 |
Procedimento para detectar a penetração de cloretos com nitrato de prata em concreto carbonatado
Procedure to detect the penetration of chlorides into carbonated concrete with silver nitrate
Procedimiento para detectar la penetración de cloruros con nitrato de plata en hormigón carbonatado
C. Vieira Pontes1 2, G. Costa Reus1 *, A. Calvo1 2, M. H. F. Medeiros1 2 3
1 Programa de Pós-graduação em Engenharia de Construção Civil (PPGECC) , Brasil.
2 Universidade Federal do Paraná (UFPR), Brasil.
3 Centro de Estudos em Engenharia Civil (CESEC), Brasil .
* Autor de contato: giovanacostareus@gmail.com
Recepção: 16 de abril de 2020.
Aceitação: 12 de fevereiro de 2021.
Publicação: 01 de maio de 2021.
Citar como: Vieira Pontes, C., Costa Reus, G., Calvo, A., Medeiros, M. H. F. (2021), "Procedimento para detectar a penetração de cloretos com nitrato de prata em concreto carbonatado", Revista ALCONPAT, 11 (2), pp. x-x., DOI: https://doi.org/10.21041/ra.v11i2.480 |
Resumo
Este trabalho tem por objetivo principal propor um procedimento padrão para a utilização do método colorimétrico para medir a profundidade de penetração de cloretos nas inspeções de estruturas de concreto em que existe a exposição aos cloretos e à carbonatação simultaneamente. Para evitar a ocorrência de resultados "falsos positivos" foram testadas as soluções de hidróxido de cálcio (Ca(OH)₂) e hidróxido de sódio (NaOH) como tratamento prévio. Os testes foram conduzidos em amostras apenas carbonatadas e em amostras contaminadas por cloretos e carbonatadas. Os resultados mostram que a solução de NaOH elimina a interferência da carbonatação. Desse modo, chegou-se a indicação de um método adequado para introdução de leituras de profundidade de contaminação por cloretos nas inspeções do concreto em campo.
Palavras-chave:
durabilidade do concreto,
ataque por cloretos,
nitrato de prata,
carbonatação,
agressividade ambiental.
Abstract
The main objective of this work is to propose a standard procedure that enables the use of the colorimetric method to measure the depth of chloride penetration during inspections of concrete structures exposed to both chlorides and carbonation. To avoid the occurrence of false positive results, solutions of calcium hydroxide (Ca(OH)₂) and sodium hydroxide (NaOH) were tested as a pretreatment. The tests were carried out on carbonated only samples, and on carbonate and chloride contaminated samples. The results show that the NaOH solution eliminates the carbonation interference. Therefore, a suitable method was found to introduce depth readings of chloride contamination in concrete field inspections.
Keywords:
durability of concrete,
chloride attack,
silver nitrate,
carbonation,
environmental aggressiveness.
Resumen
Este trabajo tiene como objetivo principal proponer un procedimiento estándar que viabilice el uso del método colorimétrico para medir la profundidad de penetración de cloruros durante las inspecciones de estructuras de hormigón expuestas tanto a cloruros como a carbonatación. Para evitar la aparición de resultados "falsos positivos", se probaron soluciones de hidróxido de calcio (Ca(OH)₂) e hidróxido de sodio (NaOH) como pretratamiento. Las pruebas se llevaron a cabo en muestras solamente carbonatadas, y en muestras contaminadas por cloruros y carbonatadas. Los resultados muestran que la solución de NaOH elimina la interferencia de la carbonatación. Por lo tanto, se llegó a un método adecuado para introducir lecturas de profundidad de contaminación por cloruro en inspecciones de estructuras de hormigón en campo.
Palabras clave:
durabilidad del hormigón,
ataque por cloruros,
nitrato de plata,
carbonatación,
agresividad ambiental.
1. IntroduÇÃo
A corrosão do aço é um dos mecanismos de degradação mais comuns nas estruturas de concreto armado, tendo como causas principais a carbonatação e o ataque por íons cloreto (Corral et al., 2013). Ambos os fenômenos são responsáveis por desfazerem a fina camada de óxido de ferro, camada passivadora, que cobre e protege as barras de aço contra a corrosão em ambientes com pH acima de 11 (Helene, 1993; Montemor et al., 2003; Moreira, 2006; França, 2011).
O ingresso de íons cloreto no concreto ocorre em diferentes velocidades em uma mesma edificação, à depender dos microclimas distintos que ocorram sobre ela, como citado por Medeiros et al. (2013), Medeiros Junior et al. (2015a) e Medeiros Junior et al. (2015b). Como relatado por diferentes autores (Helene, 1993; Montemor et al., 2003; Medeiros et al., 2009a; França, 2011; Real et al., 2015), a presença de íons cloretos no concreto armado deve-se à difusão destes elementos iônicos do meio externo para o interior da estrutura, ou à utilização de matérias primas contaminadas para a produção do concreto.
O ataque por cloretos no aço gera uma reação expansiva, isto é, os íons cloreto reagem com os íons de ferro da armadura e formam produtos (óxidos e hidróxidos de ferro) que possuem volumes maiores que os íons de ferro originais. Este fenômeno gera tensões internas que, se ultrapassarem a resistência à tração do concreto, podem ocasionar fissuras na estrutura (Cascudo, 1997; Montemor et al., 2003). Além disso, os íons cloreto corroem a armadura pontualmente (em forma de pites), reduzindo a seção transversal do elemento portante e afetando sua função estrutural (França, 2011).
Dentro deste contexto, a penetração de cloretos nas estruturas de concreto é uma possível causa de corrosão de armaduras, sendo importante para trabalhos de inspeção e diagnóstico do concreto armado o conhecimento da profundidade de penetração deste íon agressivo.
2. RelevÂncia do tema
Para inspecionar ou monitorar estruturas de concreto a fim de detectar a presença, a profundidade e/ou a evolução da penetração de íons cloreto, existe o método colorimétrico de aspersão de solução de nitrato de prata (AgNO3) (Baroghel-Bouny et al., 2007; Real et al., 2015). A aspersão do indicador químico de solução de nitrato de prata é um método colorimétrico visual de inspeção e foi originalmente normatizado pela UNI 7928, em 1978. Trata-se de uma técnica qualitativa de aplicação prática em amostras de estruturas de concreto, além de apresentar baixo custo se comparado com a extração de pó de concreto e a determinação do perfil de cloretos em procedimentos de titulação ou potenciometria (França, 2011; He et al., 2012).
De acordo com Baroghel-Bouny et al. (2007), Medeiros et al. (2009b) e Kim et al. (2013), a técnica consiste na aspersão de solução de nitrato de prata na seção transversal recém fraturada de testemunhos de concreto para formação de duas regiões distintas quanto à coloração: uma com precipitado marrom correspondente à região sem cloretos, e outra sem coloração na região afetada por cloretos. A Figura 1 mostra o método colorimétrico de aspersão de solução de AgNO3 sendo aplicado em um corpo de prova de concreto.
Figura 1. Medida da profundidade de penetração de cloretos pelo método colorimétrico visual por aspersão de solução aquosa de AgNO3 0,1 M. |
As reações fotoquímicas após aspersão da solução de nitrato de prata correspondem à combinação de íons de prata e íons cloreto livres formando cloreto de prata (AgCl), que possui coloração esbranquiçada, conforme a Equação (1). Nas regiões com ausência de cloretos livres, há reação fotoquímica entre íons de prata e íons hidroxila formando AgOH, e posteriormente Ag2O, que confere ao concreto coloração marrom (Yuan et al., 2008; França, 2011; He et al., 2012; Kim et al., 2013; Real et al., 2015).
(1) |
O método colorimétrico de aspersão de nitrato de prata é muito usado em trabalhos experimentais em que o concreto testado se encontra em condições de saturação e livres do processo de carbonatação. Muitos trabalhos publicados nos últimos anos em revistas de alto impacto (tais como: Ferreira et al., 2016; Weiss et al., 2017; Wei et al., 2018; He et al., 2018; Slomka-Slupik et al., 2018; Fernández-Ruiz et al., 2018; Lau et al., 2018; Azarijafari et al., 2018), confirmam o seu uso frequente nas pesquisas atuais.
Porém, alguns estudos (França, 2011; Real et al., 2015) apontam que os íons de prata (Ag+) da solução de nitrato de prata reagem com o produto da carbonatação, CO3, formando Ag2CO3, que também confere coloração esbranquiçada ao concreto. Por isso, existe interferência da carbonatação no método colorimétrico de aspersão de solução de nitrato de prata em materiais cimentícios gerando possível resultado “falso positivo”, como relatado por Medeiros et al. (2018).
Desse modo, ao inspecionar estruturas carbonatadas com o método colorimétrico de solução de nitrato de prata ocorre o indicativo da presença de íons cloretos em regiões que não necessariamente possuem cloretos e sim, carbonatos com pH menor que 10. Por este motivo, o resultado “falso positivo” pode inviabilizar a aplicação do método colorimétrico de solução de nitrato de prata em estruturas cimentícias expostas ao ambiente, já que a carbonatação é um mecanismo de degradação inerente às construções expostas ao meio.
Além disso, devido à ocorrência de grandes densidades demográficas brasileiras em áreas litorâneas associadas a processos de industrialização, verifica-se que os fenômenos de ataque por íons cloreto e carbonatação ocorrem simultaneamente em inúmeras estruturas de concreto armado (Real et al., 2015; Medeiros et al., 2013).
Dentro deste contexto, existe uma limitação ao uso da aspersão de solução de nitrato de prata para detecção da frente de penetração de cloretos em obras reais, em que existe a exposição a ambientes com cloretos e o processo de carbonatação, ambos interagindo com o concreto em condições de serviço e de forma simultânea. O objetivo desta pesquisa é, portanto, desenvolver um procedimento padrão para detectar a profundidade de penetração de cloretos no concreto carbonatado.
3. Materiais e mÉtodos
3.1 Materiais
Os corpos de prova cilíndricos de concreto empregados em ambas as fases da pesquisa foram dosados com cimento do tipo CPV - ARI, com as dimensões de 100 mm de diâmetro e 200 mm de altura. Para cada caso do estudo foram realizadas três repetições, ou seja, 3 corpos de prova nas mesmas condições para cada medida, e foi calculada a média dos resultados.
A Tabela 1 mostra a composição química do cimento e do fíler de quartzo empregados no proporcionamento dos materiais na dosagem do concreto. Além disso, as características físicas do cimento e do fíler de quartzo estão representadas na Tabela 2.
Tabela 1. Análise química, por fluorescência de raios X, do cimento CP V-ARI e do fíler de quartzo. | ||||||||||||||
Aglomerante | Análise Química (%) | |||||||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
CaO | SiO2 | Al2O3 | Fe2O3 | MgO | SO3 | K2O | TiO2 | |||||||
CP V - ARI | 73,21 | 10,45 | 3,59 | 3,71 | 3,66 | 3,05 | 1,36 | 0,00 | ||||||
Fíler Quartzoso | 0,00 | 95,65 | 2,43 | 0,00 | 0,00 | 1,77 | 0,00 | 0,04 |
Tabela 2. Características físicas do cimento CP V-ARI e do fíler de quartzo. | ||||||||||||||
Aglomerante | Massa específica (g/cm3) | Área específica BET (m2/kg) | ||||||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
CPV-ARI | 3,09 | 1,070 | ||||||||||||
Fíler quartzoso | 2,60 | 1,227 |
Como agregado miúdo utilizou-se areia natural quartzosa proveniente de Balsa Nova - Brasil, que tem massa específica de 2,63 g/cm³, massa unitária de 1,54 g/cm³ e módulo de finura de 2,34. O agregado graúdo foi basalto com dimensão máxima de 19 mm e massa específica de 2,64 g/cm³.
A proporção de mistura do concreto utilizado foi de 1 : 0,10 : 2,25 : 3,00 (cimento : fíler de quartzo : agregado miúdo : agregado graúdo) com relação água/cimento de 0,50. O slump foi mantido constante na faixa de 10 ± 2 cm. Este concreto apresentou resistência à compressão de 43 MPa e sorvidade de água foi 0,0059 g/cm².horas0,5.
Antes de iniciar a carbonatação acelerada, foi adotado um processo de sazonamento que consistiu no método NORIE, apresentado em Pauletti (2004). O processo consiste em dispor os corpos de prova em uma sala climatizada com umidade e temperatura controladas e, quando a variação do peso do corpo de prova for menor que 0,10 g em 24 horas, a amostra está apta para o ensaio de carbonatação acelerada.
As amostras foram sujeitas à carbonatação acelerada durante 12 semanas em câmara de carbonatação com teor de CO2 de 5 ± 0,5%. A umidade relativa no interior do equipamento foi estabelecida em 60 ± 1 % e a temperatura à 40 ± 0,3ºC. O coeficiente de carbonatação do concreto de substrato foi de 1,96 mm/semana0,5. Estes dados estão em concordância com o publicado por Medeiros, Raisdorfer e Hoppe Filho (2017).
3.2 Métodos
Concreto carbonatado - Sem cloretos:
Inicialmente analisou-se a validade das soluções de hidróxido de sódio e hidróxido de cálcio no aumento do pH da superfície do concreto e subsequente extinção do resultado “falso positivo” causado pela carbonatação no método de aspersão de solução de AgNO3.
Para isso, foram utilizados corpos de prova carbonatados e sem cloretos. Cada um dos corpos de prova foi seccionado, longitudinalmente, em quatro fatias de mesma altura para aspersão das soluções de NaOH e Ca(OH)2. Em duas fatias do corpo de prova aspergiu-se solução aquosa saturada de hidróxido de sódio (150,00 g/L), e nas outras duas seções, aspergiu-se a solução aquosa saturada de hidróxido de cálcio (1,85 g/L), objetivando testar a eficácia das soluções. A fim de se obter secagem rápida das fatias, elas foram levadas à câmara seca com 55 ± 5% de umidade relativa e temperatura à 23 ± 2ºC por cerca de uma hora.
Após este procedimento, em uma metade da seção transversal de cada um quarto de amostra seccionada, aplicou-se solução de fenolftaleína na proporção de 5 g de fenolftaleína para 276,15 g de álcool etílico para 150 g de água destilada. Na outra metade aspergiu-se, duas vezes sucessivamente, solução de nitrato de prata na concentração de 0,10 mol/L. A aplicação de nitrato de prata foi repetida para aumentar o contraste de cores entre as áreas com e sem cloretos, assim como foi executado no trabalho de Baroghel-Bouny et al. (2007).
Realizou-se, então, avaliação visual nas amostras. Se a fração com indicador químico de fenolftaleína adquirisse coloração vermelha carmim em toda sua extensão, a solução alcalina teria sido eficaz para aumentar o pH da frente de carbonatação e evitar o “falso positivo”. Ao mesmo tempo, a metade com solução de AgNO3 deveria mudar, em toda sua extensão, para a coloração marrom, ou seja, não deveria apontar o resultado “falso positivo” de presença de íons cloreto, pois os corpos de prova estavam apenas carbonatados, sem cloretos. A Figura 2 mostra o esquema do experimento idealizado.
Figura 2. Esquema do experimento para eliminação do resultado “falso positivo” causado pela carbonatação. |
Concreto carbonatado - Com cloretos:
Em seguida, o experimento foi conduzido no sentido de medir, com solução aquosa de nitrato de prata, a profundidade de penetração de cloretos em corpos de provas afetados por carbonatação e ataque por cloretos, simultaneamente. Foi aplicada, previamente, a solução alcalina inibidora dos efeitos da carbonatação na superfície do concreto. Para isso, foram utilizados três corpos de prova para cada tempo de penetração acelerada de cloretos (24h, 48h e 72h), totalizando 9 corpos de prova.
Para induzir a entrada de cloretos nas amostras de forma rápida, elaborou-se um sistema baseado na migração de cloretos. A migração dos íons é causada pela diferença de potencial elétrico entre os meios. Os íons positivos se movem em direção ao polo negativo e os íons negativos se movem em direção ao polo positivo. De acordo com Medeiros (2008), essa movimentação ocorre tanto por meio de migração quanto por difusão, porém, a migração é mais considerável nestas condições de ensaio.
Para o ensaio deste experimento, todos os corpos de prova foram saturados e, depois, imersos em solução aquosa com 3% de NaCl, uma vez que a migração ocorre em meio saturado. Depois, conectou-se uma barra de aço e uma tela metálica à uma fonte elétrica de 30 V induzindo o polo positivo no orifício no interior da amostra. Desta forma, os ânions Clˉ, desassociados na solução de cloreto de sódio, foram eletrostaticamente atraídos para dentro dos corpos de prova. A Figura 3 mostra um esquema do aparato montado para a indução da penetração de cloretos nos corpos de prova de concreto.
Após o período de imersão/migração de cloretos, os elementos de concreto foram secos em estufa à 40°C por 24 horas, esfriados por mais um dia e, então, rompidos para aspersão das soluções alcalinas. A solução alcalina foi aplicada para elevar o pH da frente de carbonatação na superfície recém fraturada e evitar a ocorrência do resultado “falso positivo”. Após a aspersão desta solução, os corpos de prova testados permaneceram em câmara seca (55±5% e 23±2 oC de temperatura) durante 01 hora para eliminar o excesso de umidade na superfície do concreto.
Posteriormente, aplicou-se as soluções de fenolftaleína (para confirmar que a solução alcalinizou a superfície) e de nitrato de prata para tentar mensurar a profundidade de penetração de cloretos. Com a distinção das regiões esbranquiçada e marrom na metade com nitrato de prata, foi possível medir a profundidade de penetração de cloretos a partir da superfície do elemento. As medidas foram realizadas com paquímetro e em cinco pontos diferentes da metade da seção transversal, como esquematizado na Figura 4.
Figura 3. Esquema de ensaio de migração de cloretos: (a) esquema da ligação elétrica; (b) foto do experimento montado. |
Figura 4. Esquema dos locais de medida da profundidade de carbonatação e da penetração de íons cloreto. |
Para confirmar a profundidade de penetração de cloretos com o teste colorimétrico, foi determinado o perfil de cloretos usando o procedimento de coleta de amostra da RILEM TC 178-TMC publicado por Vennesland, Climent, Andrade (2013). Desse modo, após o processo de migração de cloretos, os corpos de prova foram secos em uma estufa a 40 °C durante 24 horas e resfriados ao ar durante mais 24 horas. Depois disso, o terço médio dos corpos de prova cilíndricos de Ø10 x 20 cm foi usado para a coleta de pó com uma furadeira. A coleta de amostras foi realizada a cada 10 mm de profundidade, até 40 mm de profundidade. Para cada profundidade de coleta de pó, foi efetivada a determinação do teor de cloretos solúveis em ácido (cloretos totais) por titulação com nitrato de prata após um ataque com ácido nítrico, como procedimento detalhado na ASTM C1152 (2020).
4. Resultados e discussÕes
4.1 Concreto carbonatado - Sem cloretos:
A Figura 5 apresenta o resultado da tentativa de neutralizar o efeito da carbonatação no teste com o nitrato de prata utilizando a aspersão de uma solução aquosa saturada com hidróxido de cálcio e uma com hidróxido de sódio. Todas as amostras estavam carbonatadas e sem contaminação por cloretos.
Observa-se que a aspersão de solução saturada de hidróxido de cálcio não elevou o pH da camada de concreto carbonatada a ponto de atingir o ponto de viragem da solução indicadora química de fenolftaleína. É provável que isso tenha ocorrido em função da baixa concentração de hidroxila na solução saturada como hidróxido de cálcio. Isso ocorre devido à baixa solubilidade do Ca(OH)2, conforme relatado por Réus (2017).
Por outro lado, a solução de hidróxido de sódio elevou a basicidade do concreto, o que foi verificado na análise visual após aspersão do indicador químico de pH e da solução de AgNO3, resultado semelhante ao encontrado por Pontes et al. (2020). A solução de NaOH também foi eficaz para realcalinizar amostras de concreto no trabalho de Réus (2017) e Réus e Medeiros (2020).
Desse modo, pode-se dizer que a aspersão de solução saturada com hidróxido de sódio foi eficaz em eliminar a ocorrência de “falso positivo” quando se faz a aspersão de solução aquosa de nitrato de prata em concretos carbonatados, porém, sem contaminação por cloretos.
Figura 5. Corpos de prova carbonatados com (a) aspersão prévia de solução de Ca(OH)2 (b) aspersão prévia de solução de NaOH. |
4.2 Concreto carbonatado - Com cloretos:
Após a imersão das amostras de concreto na solução de cloreto de sódio no ensaio de migração de cloretos, mediu-se a profundidade de penetração de íons cloreto ao término dos ciclos de 24 horas, 48 horas e 72 horas de ensaio (Figura 6-a). Essa medição foi realizada com a aplicação prévia da solução de hidróxido de sódio, eficaz em alcalinizar o concreto carbonatado como indicado na Figura 5. Este procedimento foi realizado para impedir a ocorrência do resultado “falso positivo” que a solução de nitrato de prata apresenta em amostras carbonatadas.
A entrada de cloretos ocorreu gradativamente ao longo do tempo de ensaio e a profundidade final de penetração de cloretos no concreto foi de 26,8 mm.
A Figura 6-b mostra o perfil de cloretos totais determinado no concreto deste experimento, após 72 h de migração com a ddp de 30 V. Os dados mostram a coerência do resultado de profundidade de penetração de cloretos pelo método colorimétrico, de modo que a viragem de cor ocorreu a partir do teor de cloretos de 0,08% em relação a massa de cimento. Esta comparação foi realizada de modo a obter uma comprovação da coerência do método proposto para determinação da profundidade de penetração de cloretos.
A Figura 6-c ilustra o experimento de migração de íons cloretos e a Figura 6-d mostra uma foto de um corpo de prova após a aplicação do método colorimétrico. Esta foto mostra um corpo de prova recém fraturado cuja superfície foi previamente tratada com aspersão de solução de NaOH e posteriormente foi aplicada a solução de AgNO3. Mais uma vez observou-se que a solução de hidróxido de sódio eliminou o efeito “falso positivo” gerado pela carbonatação do concreto no método de aspersão de nitrato de prata. Isso fica evidente, pois a região das amostras com aspersão de fenolftaleína não identificou a área carbonatada, apenas a seção com solução de AgNO3 gerou mudança de coloração nas regiões com presença de cloretos livres, já que nesta fase as amostras estavam carbonatadas e contaminadas por cloretos.
5. ConclusÕes
Este trabalho apresenta um caminho possível para o emprego do método colorimétrico de aspersão de solução de nitrato de prata em condições de serviço em que existe a exposição do concreto armado ao ataque por cloretos e ao processo de carbonatação de forma concomitante. O trabalho indica o que pode ser feito antes da aplicação da solução de nitrato de prata para evitar o “falso positivo”, que tem impedido o uso deste método colorimétrico em trabalhos de inspeção em obra reais.
Neste contexto, conclui-se que o passo a passo a seguir é eficaz para viabilizar o emprego do método colorimétrico com nitrato de prata para obter a profundidade de penetração de cloretos no concreto em situações em que o mesmo está exposto a penetração de cloretos e ao processo de carbonatação.
Os passos são:
Passo 1 - Parte da peça de concreto deve ser seccionada e na superfície recém fraturada, aplica-se por aspersão uma solução aquosa saturada de hidróxido de sódio (150 g/L). Deve-se esperar cerca de uma hora para a superfície secar;
Passo 2 - Aspergir duas vezes sucessivamente (5 minutos de intervalo entre cada vez), uma solução de nitrato de prata na concentração de 0,10 mol/L. Deve-se esperar cerca de uma hora para a superfície secar e as reações ocorrerem, gerando o contraste de cor. Como ilustrado na Figura 7, a coloração marrom correspondente à região sem cloretos, e a outra sem mudança de cor corresponde a região afetada por cloretos;
Passo 3 - Efetivar a medida da profundidade de penetração de cloretos usando uma régua ou um paquímetro. Trabalhar com valores médios, mínimos e máximos de profundidade de penetração de cloretos para interpretar os resultados.
Figura 7. Ilustração do contraste obtido com a aplicação do método colorimétrico para a determinação da profundidade de penetração de cloretos, usando aspersão de uma solução de NaOH e uma de AgNO3. |
6. Agradecimentos
Os autores expressam a sua gratidão as agências brasileiras CNPq, Capes e Fundação Araucária pela bolsa e apoio financeiro, à Universidade Federal do Paraná (UFPR), ao Centro Politécnico, ao Departamento de Construção Civil (DCC), ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Construção Civil (PPGECC), ao Centro de Estudos de Engenharia Civil (CESEC), ao Laboratório de Materiais e Estruturas (LAME) e ao grupo de pesquisa de Patologia e Recuperação das Construções (PRC).
REFERÊNCIAS
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